domingo, 24 de março de 2013

O que é inteligência?

Por Celso Antunes (1)

A palavra "inteligência" tem sua origem na junção de duas palavras latinas: inter = entre e eligere = escolher. Em seu sentido mais amplo, significa a capacidade cerebral pela qual conseguimos penetrar na compreensão das coisas escolhendo o melhor caminho. A formação de ideias, o juízo e o raciocínio são frequentemente apontados como atos essenciais à inteligência. A inteligência é resumida pelo Pequeno dicionário ilustrado brasileiro da língua portuguesa como "a faculdade de compreender".

Analisando de maneira sucinta as raízes biológicas da inteligência, descobre-se que ela é produto de uma operação cerebral e permite ao sujeito resolver problemas e, até mesmo, criar produtos que tenham valor específico dentro de uma cultura. Dessa maneira, a inteligência serve para nos tirar de alguns "apertos" sugerindo opções que, em última análise, levam-nos a escolher a melhor solução para um problema qualquer.

Assim, se estamos perdidos em um lugar e precisamos achar a saída salvadora, usamos a inteligência, que apontará a melhor opção: consultar um guia, perguntar a alguém ou buscar na memória referência sobre o local procurado. Da mesma maneira, quando precisamos abrandar um problema gerado pela má interpretação de uma intervenção qualquer é a inteligência que seleciona qual deverá ser a tentativa mais válida: pedir desculpas, escrever uma carta retratando-se ou enviar um presente à pessoa afetada.

Eliminando a preconceituosa ideia da existência de uma "inteligência geral" e assumindo a ideia de inteligência em um sentido mais amplo, percebe-se que, tanto a origem da palavra quanto o verbete presente nos dicionários, encontram-se em um mesmo ponto. A inteligência é, pois, um fluxo cerebral que nos leva a escolher a melhor opção para solucionar uma dificuldade e que se completa como uma faculdade para compreender, entre opções, qual a melhor; ela também nos ajuda a resolver problemas ou até mesmo a criar produtos válidos para a cultura que nos envolve.

É evidente que a inteligência não constitui apenas um elemento neurológico isolado, independente do ambiente. Pierre Lévy (1993) desenvolveu lucidamente a noção de ecologia cognitiva, na qual avança para ultrapassar a visão isolada do conceito, mostrando que fora da coletividade, desprovido do ambiente, o indivíduo não pensaria. Todas as nossas inteligências nada mais são do que segmentos componentes de uma ecologia cognitiva que nos engloba. O indivíduo, portanto, não seria inteligente sem sua língua, sua herança cultural, sua ideologia, sua crença, sua escrita, seus métodos intelectuais e outros meios do ambiente.

Associando-se, pois, a identificação das habilidades que compõem a inteligência a esse contexto ambiental cognitivo, percebe-se que a inteligência está muito associada à ideia de felicidade.

Segundo o dicionário citado anteriormente, felicidade é o estado de alguém afortunado, de uma pessoa sem problemas. Se a pessoa que não tem problemas ou que pode resolvê-los sempre que surgem é uma pessoa feliz e se a inteligência é a faculdade de compreender ou resolver problemas, percebe-se que, quanto mais inteligentes nos tornamos, mais facilmente construímos nossa felicidade.

Não nos parece difícil associar as ideias de inteligência e de felicidade e seus estímulos ao papel da escola neste nascer de um novo milênio. A escola, como centro transmissor de informações, já não se justifica. Afinal de contas, esse centro pode e deve ser substituído por outros, menos cansativos, menos onerosos e, principalmente, mais eficientes. A figura da criança ou mesmo do adolescente indo a uma escola para colher informações é tão antiquada e patética quanto a do indivíduo que precisa se levantar para mudar o canal da televisão. Essa "antiguidade", entretanto, é curiosa. Há poucos anos, era inimaginável para um leigo em eletrônica o controle remoto da TV, como o era, para muitas famílias, a ideia da escola com outro papel. Mas esses valores foram ultrapassados e hoje o canal é alterado da própria poltrona e, da mesma forma, já não se concebe uma escola como agência de informações. Para esse fim, existem a própria televisão com seus múltiplos meios, a internet, os livros, os CD-ROMs etc. Pensar na escola com esse propósito significa propugnar por seu fim.

O papel da escola, entretanto, renova-se com estudos e descobertas sobre o comportamento cerebral e, nesse contexto, a nova escola é a que assume o papel de "central estimuladora da inteligência". Se a criança já não precisa ir à escola para simplesmente aprender, ela necessita da escolaridade para "aprender a aprender", desenvolver suas habilidades e estimular suas inteligências. O professor não perde espaço nesse novo conceito de escola. Ao contrario, transforma a sua na mais importante das profissões, por sua missão de estimulador da inteligência e agente orientador da felicidade. Perdeu seu espaço, isto sim, a escola, e, portanto, os professores que são simples agentes transmissores de informações.

Mas, na análise do conceito de inteligência e na redefinição do papel da escola surge uma dúvida extremamente válida: será a inteligência uma faculdade ampliada? Podemos nos tornar mais inteligentes? Não seríamos, por acaso, vítimas de uma carga genética imutável e a inteligência, tal qual a cor dos olhos por exemplo, um estigma que temos de aceitar para toda vida?

(1) Celso Antunes é autor de mais de 180 livros didáticos e paradidáticos, mais de 300 artigos, crônicas e ensaios sobre temas educacionais e cerca de 50 obras pedagógicas sobre diversos assuntos, entre os quais: as inteligências múltiplas, o estímulo às capacidades e competências, as estratégias de avaliação, os projetos, estudos neurobiológicos sobre a ação da mente no processo de aprendizagem, a criatividade e o uso da memória, além de glossários e jogos como estímulos.

O texto acima foi extraído do livro "As inteligências múltiplas e seus estímulos", 16ª edição, Editora Papirus.
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