quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O que é empreendedorismo?


Histórias de sucesso e a própria teoria ensinam que a melhor forma de descobrir a resposta à pergunta acima é colocando ideias em prática e fazendo as coisas acontecerem.

Por Simão Mairins e Fábio Bandeira de Mello, Revista Administradores

Alexandre Costa - Cacau Show
Embora não haja consenso entre os historiadores sobre a data e o local, especula-se que foi em 5.000 a. C., em algum lugar da antiga Mesopotâmia, que o homem inventou a roda. Verdade ou não, o fato é que, pouco tempo depois – aliado à domesticação de animais – o invento já era utilizado para potencializar a capacidade de transporte de cargas e pessoas. Podendo ir mais longe e com mais bagagem, as populações antigas construíram estradas, ergueram edificações e conquistaram novos territórios, unindo povos e dando o primeiro passo para o que, um dia, viria a se chamar de globalização.

Tudo o que a roda possibilitou ao longo da História, no entanto, só se fez possível porque o homem foi capaz de reinventá-la diante de cada nova necessidade ou desejo. No século 3 a. C., o matemático grego Arquimedes projetou o primeiro sistema de roldanas, que permitiu levantar objetos pesados, inviáveis de se erguer apenas com a aplicação de força direta. Hoje, esse sistema é utilizado, por exemplo, nos elevadores e nas academias de musculação. Na China, século 2, descobriu-se que aquele objeto circular poderia ser utilizado para o transporte de cargas médias em curtas distâncias somente com a força do homem: assim foi inventado o carrinho de mão. Já na França do século 18, com as cidades em expansão, a criação dos primeiros automóveis e da bicicleta revolucionou a mobilidade urbana.

Para o economista austro-húngaro Joseph A. Schumpeter, essa iniciativa de recombinar estruturas, redesenhar conceitos e gerar novidade tinha nome: empreendedorismo. Responsável pela introdução de uma nova visão dos sistemas produtivos, ainda na primeira metade do século XX, o teórico colocou o empreendedor no centro dos seus estudos e o posicionou como elemento chave para o desenvolvimento. Graças a ele, de acordo com Schumpeter, é que são inventados novos bens, esquematizados novos processos e desenvolvidos novos mercados.

"Apesar de serem várias as definições sobre empreendedorismo, podemos notar que alguns aspectos sobre o empreendedor estão sempre presentes, como iniciativa e paixão pelo negócio, utilização criativa dos recursos disponíveis, aceitação de riscos e possibilidade de fracassar", destaca o professor José Dornelas, autor de alguns dos principais livros sobre o assunto no Brasil.

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Quando tinha apenas 17 anos, Alexandre Costa já havia tomado consciência disso tudo e percebido que existia um mercado pouco explorado na confecção de chocolates artesanais. Com apenas US$ 500 dólares de investimento, o jovem rapaz iniciou seu negócio em uma sala de 12m² na empresa de seu pai. "Na Páscoa de 1988, com muita determinação, consegui uma encomenda de dois mil ovos de 50 gramas. Para minha surpresa, ao chegar com o pedido na fábrica, fui avisado de que não havia possibilidade de produzir ovos com esse peso. Para honrar o compromisso assumido, resolvi fazer os ovos por conta própria. Comprei matéria-prima com o dinheiro que peguei emprestado de um tio e contratei uma senhora que fazia chocolate caseiro. Após três dias com jornadas de trabalho de 18 horas, o pedido foi entregue", relembra Alexandre.

Agora, aos 40 anos, ele conta com mais de 4.400 funcionários, produz em uma fábrica de 17.000 m² de área construída, possui filiais em todos os estados brasileiros e é o grande responsável pela Cacau Show, a maior rede de lojas de chocolates finos do país. "Hoje somos uma marca moderna, democrática e inovadora. A Cacau Show revolucionou o mercado de chocolates ao oferecer produtos de alta qualidade – com carinho artesanal – a preços acessíveis", orgulha-se o empresário, que venceu o Prêmio Empreendedor do Ano 2011, promovido pela Ernst & Young Terco.

"O discurso de que o empreendedorismo nasce com o indivíduo vem mudando cada vez mais. Acredita-se que o processo empreendedor possa ser ensinado e entendido por qualquer pessoa, e que o sucesso é decorrente de uma gama de fatores internos e externos ao negócio, do perfil do empreendedor e de como ele administra as adversidades encontradas no dia-a-dia", afirma Dornelas.

Um exemplo disso é a história de André Luís, ex-morador de rua e menino do tráfico, que descobriu que poderia ter uma vida diferente sendo empreendedor. "Eu fiz um curso de informática no período que passei no Instituto Padre Severino (centro de reclusão de menores do estado do Rio de Janeiro). Aproveitando os conhecimentos de edição de textos, diagramação e editoração de imagens que adquiri lá, resolvi criar um informativo", conta André, que hoje é dono do jornal Plantador Fiel, cuja tiragem mensal de oito mil exemplares circula no Complexo do Alemão.

Empreender no Brasil
Em abril deste ano, a pesquisa mundial Global Entrepreneurship Monitor (GEM) apontou que o Brasil tem a maior taxa de empreendedores iniciantes do G20 (grupo das 20 maiores economias do mundo) e do BRIC (reunião de países emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia e China). Em números, isso significa que, em 2010 – ano base do levantamento – 21,1 milhões de brasileiros eram empreendedores em negócios com até três anos de atividade, ficando atrás apenas dos chineses.

A pesquisa também aponta que o empreendedorismo no Brasil tem sido motivado mais por oportunidades do que por necessidade (casos em que se empreende por não haver outra alternativa) – o que, pelo menos teoricamente, indica uma atividade mais qualificada. Em complemento, o Indicador Serasa Experian de Falências e Recuperações registrou, em janeiro, o menor índice de pedidos de falência em um início de ano desde 2005, embora o número ainda continue alto.

Por trás das estatísticas tão animadoras, entretanto, os empreendedores brasileiros têm ainda muitos obstáculos a superar, principalmente aqueles relacionados ao ambiente econômico e empresarial do país, como, por exemplo, burocracia excessiva, uma das cargas tributárias mais altas do mundo e infra-estrutura incipiente.

De acordo com dados do Banco Mundial, o Brasil ocupa a vergonhosa 127ª posição no ranking de facilidade de fazer negócios, atrás de países como Botswana (52º), Azerbaijão (54º), Vanuatu (60º), Samoa (61º), Tonga (71º) e Mongólia (73º). No mesmo levantamento, o país aparece entre os mais complicados na hora de se abrir um empreendimento (128º no ranking de facilidade de se abrir um negócio), atrás de Irã (42º) Moçambique (65º), Etiópia (89º) e Cabo Verde (120º). Na América Latina, Peru (54º), Chile (62º) e Colômbia (73%), por exemplo, também estão em situação melhor que a do Brasil.

Então, saber lidar com a dificuldade é um pré-requisito que, para os brasileiros, vem antes de muitos outros. "O custo Brasil é, de longe, um dos grandes entraves da competitividade das empresas brasileiras. Mesmo assim, muitos empreendedores conseguem se diferenciar no mercado por meio da inovação, criando vantagem competitiva em relação à concorrência. Como todos os empreendedores sofrem com as altas cargas tributárias, fiscais e trabalhistas, devem ser buscadas soluções inovadoras, que permitam a diferenciação no mercado", destaca Dornelas.

"O empreendedor brasileiro já está familiarizado com a burocracia. Além do mais, nós já temos várias ações de desburocratização para quem quer iniciar uma atividade empresarial, como o próprio Empreendedor Individual. A burocracia dificulta, mas não é impedimento para quem deseja empreender", reforça Joana D'Arc de Melo, coordenadora do Programa de Empreendedorismo do Sebrae-PR.

"É verdade que ainda há muita gente empreendendo no Brasil simplesmente por necessidade. Mas nada impede que essas pessoas se capacitem e possam ser bons empresários. Aliás, esse é um dos principais papéis do Sebrae: orientar os que começam por necessidade, para que eles minimizem os riscos e possam desenvolver uma atividade mais qualificada", afirma Joana D'Arc.

No caso de André, os diferenciais foram sua habilidade de negociação e um bom plano de negócios. Ele conta que, após participar de um curso do governo federal, foi habilitado a participar de uma feira de negócios, onde pôde expor seu trabalho e captar patrocinadores. "Hoje, a L'Oreal Paris e o Banco do Brasil são nossos parceiros graças a isso", conta André.

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